sábado, 1 de março de 2008

Ele perguntou o que ela queria dizer, e ela permaneceu silenciosa, a sorrir e a brincar com a sua trela. Ele insistiu, fez-lhe festinhas nas orelhas, exactamente como ela gostava, fez-lhe renovadas juras de amor e de obediência, mas ela nada respondeu e deixou-se adormecer tranquila nos seus braços, como sempre, como se nada tivesse alterado a rotina que partilhavam.
Na manhã seguinte, quando ela acordou apercebeu-se que ele estava acordado a olhá-la, e antes que ele pudesse dizer alguma coisa, começou a cantar muito devagarinho, enquanto percorria o tronco dele com as pontas dos dedos:
"Em cima do piano,
Está um copo com veneno,
Quem bebeu...
Morreu..."
E desatou a rir com uma alegria infantil que ele não lhe conhecia.

6 comentários:

Maria das Mercês disse...

Gostei bastante, Rita, creio que o desenvolvimento do enredo se encaminha para locais insondáveis... Great!

Renata Correia Botelho disse...

Boa sequência, Rita!

rita disse...

obrigada, meninas.
agora estou inquieta para ver que caminhos este casal vai trilhar ;)

Mário disse...

auguro a este casal um fim trágico: o divórcio litigioso. Vão lutar nos tribunais pela tutela das coleiras.

leonor disse...

Gostei muito, Rita. Mantiveste a sensação descrita pela Susana em comentário anterior de preservação de uma mesma voz autoral.

Anónimo disse...

A ideia do veneno é brilhante. Introduz a suspeição, elan vital de qualquer drama interessante. Além disso, retira-nos da intimidade sufocante destas duas criaturas...depois de ler tudo isto, consigo imaginar o aspecto das personas...mas não consigo imaginar as suas personalidades!

mas estou a gostar, muito

continuem

tenciono visitar-vos todos os dias, só para Vos...confesso, contudo, a minha admiração despegada. Quem me dera ser capaz de escrever como escrevem.