terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Traiçoeira.
Como é que esta escapou, sempre gostava de saber.
É porque sempre viveu nas minhas veias — parasita! —, sempre engrossou o meu sangue, alargando as minhas artérias até quase explodirem!
Tenho de me concentrar.
Ponho-me em pé no topo do muro. Para baixo, a vertigem da liberdade. Não há espias que me segurem, não há raízes a prender-me os pés, sou vela bojuda, sou folha deslaçada, sou… porque não salto?
O grito do enfermeiro empurra-me. Desapareço na curva do passeio, o asfalto estalado a abrir-se debaixo dos meus pés; por cima, um traço magenta a evaporar-se para Levante, um vento quente a enfunar-me a alma.
Já fui.

7 comentários:

Renata Correia Botelho disse...

Mantiveste a estranheza do resto do conto, óptima opção! No fundo, ficamos sem saber uma série de coisas, mas o interesse também está nisso! Muito bem!!!
Mário, preparado para o grande desafio que amanhã começa???

leonor disse...

Mostraste o teu poder de síntese e retomaste a ambiguidade do início do conto. É uma maneira de concluir, conferindo circularidade ao todo.
Ficamos, de facto, na ignorância de muitas coisas. A menina foi forretinha e não nos disse o que mais queríamos saber: ele benzeu-se antes de saltar? Esta dúvida nunca mais sairá do meu espírito.

Quem terá de se benzer agora, e muitas vezes, é o Mário.
Até amanhã!

rita disse...

adorei o "já fui.", e o grito do enfermeiro a empurrar o nosso amigo.
venha o próximo ;)

Maria das Mercês disse...

Meus queridos colegas bloggers, ficámos realmente sem saber uma data de coisas... mas dentro daquela esquizofrenia toda, qualquer coisa seria possível! Agradeço palavras gentis de todos.
Mário, cá te aguardamos! Prontas para tudo, meninas?

Nuno Costa Santos disse...

Bom final. Estranho e lacónico, como convém a um corpo insólito. Também estou curioso em relação ao tom do Mário. Dá-lhe. Até já. Abraço e beijinhos, Nuno

Su disse...

Boa Maria! Um louco nunca se desvenda por completo, mesmo que quisesse não saberia como. Nós é que contávamos com a sanidade do escriba para nos dizer o que queríamos ouvir... ou não. Mantiveste a integridade da personagem, da tua, porque coitado este homem, ao longo do conto foi, no mínimo, bi-polar. Gostei mesmo. Mário, camarada, companheiro, amigo, avante!

Maria das Mercês disse...

Mário, filho, já estou ficando preocupada! Não me digas que te foste também!